Entendendo a seletividade alimentar infantil

Meu filho não come! Quantos pais não disseram esta frase ao longo dos anos? Tanto é que o tema virou livro, documentários, série na TV, vídeo no Youtube e post para este blog. Mas, hoje, a intenção é falar sobre um comportamento mais específico e ainda pouco abordado no consultório e literatura: a seletividade alimentar infantil.

Recusar alimentos é algo típico das crianças. Fazer birra, chorar, dizer “não”, brincar com a comida ou levantar da mesa são comportamentais normais e esperados. Para algumas crianças, porém, este problema persiste na infância e demais fases da vida, tornando-se um transtorno alimentar.

O que é a seletividade alimentar infantil?

Também chamado de transtorno alimentar seletivo, o distúrbio se caracteriza pela rejeição aos alimentos, levando a uma dieta restritiva. A seletividade alimentar é composta por uma tríade: recusa alimentar, pouco apetite e desinteresse pelo alimento.

Normalmente, essas crianças aceitam cerca de 10 tipos de comida, sendo elas, em sua maioria carboidratos e produtos industrializados, refinados, com excesso de açúcar. Geralmente, há uma aversão a frutas, verduras e legumes.

De acordo com os sistemas de classificação do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM-IV) e CID-10, a seletividade alimentar infantil não é descrita como um diagnóstico específico de transtorno alimentar. No entanto, é associada a uma dificuldade persistente de comer de forma adequada, com falha no ganho peso.

SELETIVIDADE ALIMENTAR INFANTIL - TRATAMENTO

Como saber se meu filho tem seletividade alimentar?

Há uma linha tênue entre saber o que é o comportamento normal de uma criança e a seletividade alimentar. Afinal, todos temos preferências alimentares. Alguns não gostam de espinafre, outros não podem nem sentir o cheiro de tomate e há ainda quem nunca coloque feijão no prato. Somos pessoas diferentes, logo, temos gostos diferentes.

A principal dica, então, é observar a criança. Como ela se comporta no momento da refeição? Parece algo difícil e doloroso para ela? Você percebe que o cheiro, textura ou sabor dos alimentos lhe causam repulsa? É um comportamento frequente? A criança apresenta preferência por determinadas marcas de alimentos ou mesmo a temperatura em que são servidos?

Vale lembrar também que a seletividade alimentar infantil, embora não seja restrita a esse grupo, é comum em crianças portadoras de autismo e transtornos de ansiedade.

Seu filho não gostar de brócolis é diferente de rejeitar praticamente todos os alimentos ofertados. Sua filha não querer comer uma laranja é diferente de quase nunca querer comer. É preciso saber diferenciar o que é regra e o que é exceção.

Quais são as causas da seletividade alimentar infantil?

Não há uma consenso sobre a causa do problema. Podemos, no entanto, elencar alguns motivos, que vão variar dependendo do caso, mas que, em sua maioria, se relacionam a aspectos biológicos e psicológico.

Algumas crianças tem um paladar muito aguçado, o que pode provocar a rejeição aos sabores mais fortes. Estudos revelam que algumas crianças apresentam uma aversão sensorial, ou seja, não suportam o cheiro, a textura, a aparência e o sabor de alguns alimentos.

Na literatura, há relatos de algumas crianças que mostram-se ansiosas diante de alimentos com molho ou que são fáceis para se sujar. Isso pode estar associado a mães obsessivas por limpeza ou que não permitiram ao filho usar as mãos para alimentar-se. Pais com depressão e transtornos alimentares tendem igualmente a apresentar filhos com maior risco para seletividade alimentar.

Há ainda a possibilidade da rejeição estar relacionada a algum evento traumático. Pode ser que a criança tenha vivenciado ou ouvido algo que levou a este comportamento. Existe, por exemplo, a possibilidade de que um quadro de refluxo faça que com os pequenos tenham medo de comer e sentir dor.

O mesmo vale para crianças que ficaram hospitalizadas, com sondas, ou aquelas com quadros severos de alergias alimentares. Às vezes, elas viram alguém passar por essas situações e aquilo ficou marcado de forma negativa.

Não há, por outro lado, evidências que relacionem o quadro de seletividade alimentar infantil com comportamentos característicos de transtornos alimentares, como: fazer dieta, episódios de compulsões alimentares e controle obsessivo do peso corporal.

SELETIVIDADE ALIMENTAR INFANTIL - CONSEQUÊNCIAS

Em qual idade começa a seletividade alimentar?

Todas. Desde a introdução alimentar até o período escolar. Não há uma idade exata para que a criança comece a apresentar esses comportamentos. Mas para se ter uma ideia, a literatura relata que a seletividade alimentar é mais frequente em crianças de 4 a 24 meses, totalizando de 19% a 50% dos casos.

Quais são os impactos na vida da criança?

De primeira, as pessoas pensam que o principal problema da seletividade alimentar infantil é a perda de peso. De fato, uma dieta restritiva leva a uma alteração significativa no peso desta criança. Mas isso não é regra. A criança pode, sim, ter seletividade alimentar e se manter dentro da média esperada.

Isso, porém, não significa ser saudável. Essa falta de variedade alimentar em alguns casos leva a deficiências nutricionais, de macro e micro nutrientes, que podem prejudicar o desenvolvimento deste indivíduo.

Mas, talvez, um dos impactos mais importantes seja no aspecto psicológico. A criança pode desenvolver fobia social por se sentir desconfortável e intimidade em comer na frente de outras pessoas. Como a maioria dos eventos sociais envolvem comida, estes se tornam momentos estressantes para a criança com seletividade alimentar.

Como lidar com este problema?

Procurando ajuda e não só de um médico, mas de uma equipe multidisciplinar, que inclui psicológico, fonoaudiólogo, nutricionista, psiquiatra, etc. É importante entender que a criança não está com “frescura” e evitar comparações.

Nesse contexto, o psicológico tratará do aspecto social, identificando gatilhos, mediando possíveis conflitos familiares e entendendo a origem do problema. O fonoaudiólogo é responsável por melhorar a relação dos pequenos com a boca e o alimento, enquanto o nutricionista orienta a família sobre como apresentar os alimentos de forma diferente, introduzir novos sabores e adequar a dieta para as necessidades da criança. O psiquiatra, por sua vez, pode tratar sintomas como insônia ou identificar problemas relacionados a seletividade alimentar, como a ansiedade infantil.

Dependendo da idade da criança, é possível conversar sobre o diagnóstico e conscientizá-la sobre as consequências do transtornos.

Tenha em mente que a evolução é possível. Não podemos dizer que será fácil, pois a seletividade alimentar infantil é um desafio e tanto. Mas é possível superar essa fase e finalmente deixar de dizer a frase que iniciou nossa conversa… Para isso, conte com nossa equipe de nutricionistas!